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VOCÊ SABIA? Maior jogador português da história foi indicado por ídolo, mas São Paulo rejeitou o investimento

Eusébio em ação com a camisa do Benfica, nos anos 1960 (SL Benfica)


RAFAEL EMILIANO
@rafaelemilianoo


Os torcedores mais novos podem até associar automaticamente a qualidade do futebol português a nomes recentes como Figo e Cristiano Ronaldo. Mas se houve um responsável para fazer com que o esporte mais popular do mundo atingisse de fato um nível de qualidade internacional, esse foi Eusébio, até hoje o maior artilheiro português da história, com 578 gols em 575 jogos na carreira.


Maior jogador da história do Benfica, o moçambicano (na época o país africano ainda era uma colônia portuguesa) foi o responsável direto por dar um título da Copa dos Campeões da Europa aos Encarnados, além de conquistar 11 títulos da liga nacional e cinco taças.


Pela seleção portuguesa, foi o comandante da histórica campanha de terceiro lugar na Copa do Mundo de 1966, alcançada na primeira participação lusa na competição, na Inglaterra. Feitos que o fizeram ser uma espécie de resposta do Velho Continente a Pelé, o Rei.


Tudo isso é bem provável que você já saiba.


O que provavelmente você não sabe é que por muito pouco Eusébio não construiu sua história bem longe de Lisboa. Mais precisamente no ainda em construção estádio do Morumbi. Com a camisa do São Paulo.


Eusébio e Pelé, símbolos de uma era de ouro do futebol (SL Benfica)

A história começa em 1959, quando um velho ídolo tricolor aceitou o convite para atravessar o Atlântico e treinar o pequeno Leixões: o volante Bauer.


Revelado pelo próprio São Paulo, José Carlos Bauer é dono de 400 jogos e 18 gols nos 13 anos que atuou com a camisa tricolor, campeão paulista em 1945, 1946, 1948, 1949 e 1953. Titular da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1950, ganhou o apelido de 'Monstro do Maracanã' pela imprensa carioca mesmo com a traumática derrota para o Uruguai em pleno palco da então capital federal.


Naquela virada de década, Bauer já havia pendurado as chuteiras após passagens por Botafogo, Portuguesa e São Bento de Sorocaba. Decidiu virar técnico. E logo após uma passagem relâmpago pelo Juventus da Mooca, foi convidado pelo então diretor do Leixões, Serafim Neves, para dirigir o time português.


O convite não surgiu à toa. Neves era o lateral-direito e capitão do Belenenses em um amistoso que o Tricolor realizou contra os lisboetas na capital portuguesa em 6 de maio de 1951 (vitória brasileira por 1 a 0). 


Funcionário público federal da ditadura António Oliveira Salazar, que comandava Portugal, Neves atuou como uma espécie de relações-públicas da delegação são-paulina. Que tinha Bauer como capitão. Criou-se uma amizade, troca de correspondência e indicação de jogadores brasileiros.


Natural, portanto, que após Bauer se tornar treinador, fosse convidado para trabalhar na 'Terrinha'.


A Passagem de Bauer por Portugal, entretanto, foi mais curta que o previsto. Neves logo teve que deixar o posto de diretor do Leixões, transferido para a colônia de Moçambique por ordem  da ditadura do Estado Novo, com o objetivo de atuar como adjunto da Secretaria de Esportes portuguesa no então território português.


O capitão Bauer puxa a fila do São Paulo no amistoso contra o Belenenses (Morumbiteca)

Bauer voltou ao Brasil em 1960 e treinou a Ferroviária de Araraquara, recebendo um convite do velho amigo para que levasse a equipe paulista para excursionar na África, aproveitando a viagem para uma série de amistosos realizados na Europa. E assim foi feito.


Em junho daquele ano, a Ferrinha disputou seis jogos em Lourenço Marques, como era chamada a hoje capital Maputo. Ganhou todos os jogos, mas os dias 11 e 18 registraram a história. Nos duelos ante as seleções de Moçambique e Lourenço Marques, respectivamente, atuou como atacante dos adversários brasileiros um jovem de 17 anos que ficaria marcado como um dos melhores da história: Eusébio da Silva Ferreira, que inclusive marcou um gol no primeiro amistoso (placar de 3 a 1 para a Ferroviária).


O ídolo são-paulino ficou admirado com o que vira. Conversou com seus jogadores, entre eles o volante Dudu, que se tornaria ídolo do rival Palmeiras e é o tio de Dorival Júnior, e confirmou a dificuldade que tiveram em marcar o jovem. Tratou então de colher mais informações sobre a joia e tratou de correr ao Morumbi tão logo retornou ao Brasil para indicar Eusébio ao então presidente são-paulino Laudo Natel.


Fora as dificuldades burocráticas de imigração para nativos das colônias portuguesas (vivia-se uma ditadura, lembremos), Eusébio ainda atuava no Sporting Lourenço Marques, que como o nome entrega, era um clube sustentado pelo gigante lisboeta. 


Vivia-se a época das vacas magras no Tricolor, com poupança de recursos para a construção do Morumbi. E em reuniões internas, cogitou-se que obter a liberação de Eusébio sairia demasiadamente caro por uma aposta de um centro considerado menor do futebol. 


Bélla Guttmann (direita) festeja o Paulista de 1957 ao lado de Zizinho (Moruimbiteca)


Bauer insistiu no assunto até outubro, quando o Sporting foi o convidado pelo Tricolor para a inauguração de seu coliseu estádio. Mas o que ele não sabia era que Eusébio já vinha há muito sendo observado por olheiros da capital. E sua opinião foi fundamental para a decisão sim, mas do Benfica.


O 'Pantera Negra', como era chamado, já tinha tudo acertado para ir aos Leões lisboetas, que inclusive o levaria ao Brasil para o amistoso contra o Tricolor. 


Só não contavam com a astúcia do Benfica, que arrumaram uma documentação falsa para Eusébio desembarcar em Lisboa sem ser descoberto pelo rival, levando-o à Luz. Quando o Sporting descobriu, a mãe do ídolo já tinha assinado a liberação aos Encarnados. 


Tudo por culpa de... Bauer. Afinal, diante da recusa são-paulina, o ex-volante pegou o telefone e informou o húngaro Bélla Guttmman, que havia passado pelo Tricolor e estava no Benfica do que vira. O treinador campeão paulista de 1957 confiava na palavra do 'Monstro do Maracanã', a quem elegera um dos melhores que viu jogar, e diante do relato deu o aval definitivo para os Encarnados roubarem a joia do rival.


E o resto é história...


Por achar que o clube onde foi ídolo lhe menosprezava, afinal ignorou as indicações não só de Eusébio, como do próprio Dudu, Bauer rompeu de vez com o São Paulo. Ficou anos sem ter uma boa relação com o Tricolor. E sempre lembrou do episódio 'Pantera Negra' ao falar sobre as mágoas com os dirigentes tricolores. Morreu em 2007, por exemplo, trabalhando em escolinhas de futebol do rival Corinthians. 


Em toda a sua história, o São Paulo teve apenas dois jogadores portugueses. Nenhum com grande destaque. O volante Iba Ly, por exemplo, foi o primeiro africano a ser relacionado para uma partida do clube, neste ano. Como seria a história se Eusébio desembarcasse no Morumbi? 




 

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